Lei da cópia privada, versão 2014
A passagem em conselho de ministros da nova lei da cópia privada e consequente próxima muito provável aprovação na assembleia deixou-me muito pouco surpreendido hoje. Enojado, triste, decepcionado mais uma vez com os meus representantes políticos sim, mas não admirado. À terceira é de vez, dizem, especialmente quando à terceira se junta a larga experiência de quem sabe bem que a melhor maneira de fazer passar estas coisas é de fininho, na altura certa, durante Agosto quando país está a banhos, evidentemente, minimizando assim o risco de que o barulho e influência da opinião pública e mais uns quantos que até podiam fazer alguma coisa se traduza no que quer que seja que impeça a sua aprovação. Tiro-lhes o chapéu pela estratégia e inteligência (não é sarcasmo).
Gostava também de poder dizer que o Sr. secretário de estado da cultura Jorge Xavier, um legítimo membro de um governo que nós Portugueses elegemos para nos representar, foi corajoso porque defendeu as suas convicções e usou o seu poder e a sua força política para servir a maioria de nós cidadãos. Mas não. O máximo que consigo dizer dentro dos padrões da educação que me foi dada, é que ao invés, ele foi sim o protagonista de um enorme ato de cobardia e insensibilidade e que sucumbiu com bastante facilidade aos antigos desejos e pressões daqueles que na minha opinião se caracterizam não por criar, como seria de esperar dos que se dizem representantes da cultura, mas sim destruir. Destruir o que for preciso à custa da sobrevivência das suas obsoletas e decrépitas existências e dos seus interesses e necessidades financeiras e seus dependentes.
Devo também dizer que o que realmente me choca não são os milhões todos que a AGECOP vai arrecadar dos nossos novos impostos e redistribuir pelas associações todas que por aí andam. Em termos relativos, claro seja, nem são assim tantos milhões nem são assim tantos impostos para o consumidor. Também não vou na cantiga de que nos tratam como piratas e que isso é injusto porque não só esta lei não tem nada que ver com a pirataria, como fazer de conta quem tem só contribui para um regime generalizado de desinformação e confusão que beneficia muito mais quem tem o interesse nisto do que quem se sente ultrajado. E finalmente também vale de pouco começarmos com a história de que agora vamos comprar tudo online e lá fora porque nesse caso informem-se melhor meus caros, a grande tendência da comissão europeia é no sentido de garantir que todos os comerciantes dos países membros passam a taxar as vendas, quer sejam bens ou serviços, físicos ou digitais, de acordo com os impostos do país do comprador, não se iludam minimamente.
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O que me choca realmente é o principio disto tudo: assumirmos que existência destas associações todas faz sentido e de que é necessário e natural recuperar uma lei antiga em função das receitas que foram perdidas por parte dos seus beneficiários, mas sem a mudar na sua essência. Actualizar uma lista de suportes tecnológicos para chegar a um número em vez de reconhecer efectivamente que todos os paradigmas de produção de consumo de cultura mudaram nos últimos 20 anos e que a tecnologia não significa nada, zero, não foi mais do que um instrumento para o que realmente é importante salientar: uma profunda mudança de comportamento de quem faz cultura, de quem a consume e dos modelos de negócio subjacentes.
Os humanos são adversos à mudança é sabido, consideram-na uma ameaça e resistem-lhe sempre. No entanto, e paradoxalmente, a história contradiz este preconceito: as sociedades e as culturas só evoluem quando realmente há inovação e mudança. A revolução que decorre não é tecnológica, é social e comportamental, acordem por um momento, o mundo mudou todo.
Estou perfeitamente disponível para discutir qual é a melhor forma dos meus impostos ajudarem a cultura e os autores Portugueses, gosto de cultura, respeito a propriedade intelectual, tenho uma profunda admiração pelo trabalho criativo e pelo talento artístico, sinto-me solidário pelas dificuldades de muitos, mas assim não, isto não é nada nem beneficia quem realmente merece. O sistema não pode continuar a alimentar modelos falidos, opacos e sem futuro. A bomba vai rebentar, mais tarde ou mais cedo.